A origem do novo Aranha Ultimate

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A história resenhada abaixo foi publicada no Brasil em Ultimate Marvel 28 a 32.

Peter Parker morreu tragicamente, sacrificando-se para salvar seus entes queridos, o que rendeu uma boa história, embora não tão marcante quanto poderia ter sido. Seja como for, o universo Marvel Ultimate não poderia ficar sem seu carro-chefe, pois a verdade é que os outros títulos da linha andam bem fracos.

Você já sabe o que aconteceu, a notícia foi amplamente divulgada à época e ganhou muita atenção da mídia, incluindo veículos que costumeiramente não abrem espaço para as HQs. Peter morreu, mas outro adolescente tomaria seu lugar levando seu legado adiante: Miles Morales, um jovem do Brooklyn, negro e de ascendência latina. E já que toquei nesse assunto, vamos tirar logo a questão racial do caminho.

MILES MORALES E OS NOVOS TEMPOS

É óbvio que a intenção do roteirista Brian Michael Bendis em tornar seu novo Aranha mais diversificado racialmente é para atrair mais público dessas camadas da população e ampliar a diversidade da galeria de personagens, algo que as principais editoras dos EUA têm buscado fazer já há algum tempo. É só lembrar que o próprio Aranha já teve uma versão indiana alguns anos atrás. E se isso por acaso também causar interesse da mídia, melhor ainda.

Isso pode até ser visto por um viés oportunista, mas seja como for, não é algo ruim. Pelo contrário, reflete melhor nossos tempos de melhor integração racial, miscigenação e globalização. A maioria dos super-heróis clássicos só é branca pela simples razão de terem sido criados décadas atrás, em tempos mais intolerantes, quando a sociedade estadunidense via cidadãos de outras ascendências que não a caucasiana como de segunda classe.

Os tempos mudaram e, como a proposta do próprio universo Ultimate é ser mais conectada e próxima ao mundo moderno, nada mais natural que dar a um herói de peso um bronzeado mais caprichado. Mas o que isso influi nas histórias em si? Baseado nesse arco inicial, absolutamente nada!

UM NOVO ESCALADOR DE PAREDES

Temos aqui uma história de origem bem parecida com a do Peter Parker Ultimate, sem pressa nenhuma para colocá-lo em seu uniforme, esmurrando bandidos. Brian Michael Bendis sabe que precisa apresentar bem o personagem e torná-lo tão simpático quanto Peter, ou as viúvas de Parker não largariam de seu pé.

E é exatamente isso que ele faz, mostrando de forma satisfatória como diabos duas pessoas sem qualquer relação podem ser picadas por duas aranhas geneticamente alteradas diferentes sem parecer uma grande forçada de barra. Em seguida prossegue para a tradicional descoberta dos poderes, as dúvidas e lições de moral, até que finalmente Miles decide usar seus poderes para ajudar as pessoas. Afinal, como você sabe (e sou obrigado por lei a escrever aqui), com grandes poderes vêm grandes responsabilidades.

É uma história de origem bem padrão, com todos os passos que você já conhece bem, e como escrevi dois parágrafos acima, bastante similar em estrutura com o que o próprio Bendis já havia feito com o Aranha Ultimate original. Pode não ganhar pontos em originalidade, mas caramba, como é divertido! É o tipo de história você lê cada edição em 10 minutos, mesmo contendo os muitos diálogos verborrágicos característicos do roteirista.

O fator “diversão passageira”, contudo, acaba escondendo num primeiro momento uma trama bem tecida e cheia de nuances, cuja extensão verdadeira só percebi após dar uma repassada nas revistas para escrever essa resenha.

DECISÕES MAIS DIFÍCEIS

O Peter Ultimate estava na vanguarda do surgimento dos superseres no universo em questão. Tudo era novidade. Miles habita uma Nova Iorque que já está acostumada com invasões alienígenas, maremotos causados por terroristas mutantes e outras barbaridades. Morales não sofreu nenhuma grande tragédia que o impulsionou a tomar o caminho correto. E mais, ele sabe exatamente o que aconteceu ao seu antecessor, e mesmo assim decide seguir em frente. Isso diz muito sobre o personagem de maneira bem sutil.

A cena onde um confuso e chocado Miles pergunta à Gwen Stacy, em pleno funeral de Peter, por que ele fazia o que fazia, é o grande momento desse arco inicial e o ponto de virada do personagem, que até então escondia suas recém descobertas habilidades por medo de ser taxado como mutante e preso. É um personagem com mais medos e dúvidas, mas ainda assim com uma bússola moral mais forte.

Brian Michael Bendis, depois de anos com o Homem-Aranha anterior, parece ter encontrado um novo fôlego em Miles Morales. Baseado no que apresentou nesse primeiro arco, podemos esperar muitas boas histórias com os mesmos diálogos e situações divertidas que tornaram as aventuras do Peter Ultimate tão marcantes.

A arte de Sara Pichelli combina muito bem com o personagem, sendo tão boa quanto a de Mark Bagley, embora seu traço lembre até mais Stuart Immonen, que substituiu Bagley ao final de sua primeira passagem pelo título. Miles realmente parece um adolescente e tanto as cenas de ação quanto as de diálogos são bem dinâmicas sobre sua batuta.

Este é apenas o começo e ainda há muita coisa por vir (ou não, já que pelo visto a Marvel estuda cancelar o Universo Ultimate em breve), mas já se pode dizer que Miles Morales tem potencial para ser um personagem tão querido e marcante quanto Peter Parker. Só resta continuar acompanhando para ver se este potencial será realizado.