Angra e o Aqua: um álbum injustiçado

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Eu já disse em outra ocasião que foi por causa do Angra que o Heavy Metal entrou na minha vida. E não só a banda foi uma das que me inspirou a ouvir os sons do Vento Preto, como também é uma das que eu mais ouço até hoje. Assim, aproveitando as novidades a respeito do próximo disco da banda – que se chamará Secret Garden e será lançado por aqui no ano que vem -, resolvi relembrar nesta matéria o último álbum lançado. Mais do que isso, aqui eu me proponho a defendê-lo, pois o que mais se vê na internet a respeito do disco são pessoas falando mal dele.

O DISCO

Intitulado “Aqua“, o sétimo disco da banda foi o primeiro em que eu pus as mãos e ouvi de cabo a rabo. Assim, como acontece com todo mundo no primeiro disco, eu ouvi o Aqua sem parar por pelo menos uns quatro meses.

Obviamente, depois eu vim a conhecer os clássicos da banda e o Aqua acabou ficando esquecido na minha prateleira de discos. Porém, eis que muito tempo depois eu tirei a poeira do álbum e parei para ouvi-lo novamente, desta vez sem os vícios da primeira vez. E devo dizer que o álbum ainda continua muito bom de se ouvir.

Não discordo que o álbum tem problemas – e alguns deles são bem graves – mas uma coisa que eu nunca vejo ninguém comentando são as qualidades que as músicas têm. Mais do que isso, a ótima construção do disco faz com que eu não entenda como as pessoas conseguem ignorar isso e só perceber os erros cometidos. E, para estabelecer um contraponto e mostrar uma visão que quase ninguém mostra do álbum, eu fiz esta análise.

OS ACERTOS

Primeiramente, devo dizer que vou usar o Temple of Shadows como contraponto para rigorosamente tudo nesta análise. Não só porque o Temple of Shadows é um dos melhores álbuns da banda, mas porque os dois são extremamente parecidos, e você vai perceber isso também.

O primeiro ponto que eu quero defender é que o conceito do Aqua é muito bem construído. Muito. Arrisco dizer que mais até que o seu “primo famoso”, o Temple of Shadows, cuja história é contada fora de ordem e bagunçou a minha cabeça por algumas horas até eu descobrir isso. A história do Aqua, que conta a saga “A Tempestade”, de Shakespeare, ao menos, é contada na ordem certa.

E este conceito, a meu ver, foi tão bem construído, que o clima criado pelo álbum provoca uma imersão tão profunda quanto o próprio Temple of Shadows: Ashes é uma conclusão para o álbum tão grandiosa quanto o foi a dupla Late Redemption/Gate XIII, em que o arrependimento de Próspero fica tão patente quanto os questionamentos do Caçador da Sombra foram em 2005.

Agora, falando da introdução dos dois álbuns, fica claro que, de um ponto de vista conceitual, a abertura do Aqua faz mais sentido do que a do Temple of Shadows. Vou explicar: Viderunt te Aquae traz a tensão de uma tempestade, que de fato ocorre e é o que inicia a história toda, em Arising Thunder. Já Deus Le Volt! é a frase máxima do Papa na Primeira Cruzada, evento que, de acordo com a história contada no disco, só vai acontecer no meio da The Shadow Hunter – e Spread Your Fire, que é a música que de fato sucede Deus Le Volt!, traz um fato ocorrido anos antes da frase ser proferida pelo Papa.

Não questiono aqui que, a despeito do conceito criado, de um ponto de vista musical as aberturas dos dois discos funcionam perfeitamente. O ponto é que um até hoje é visto como uma história espetacular e o outro fica completamente esquecido – ainda que tenha contado uma história de uma maneira melhor do que o seu “primo famoso”. Por quê isso? O grande problema é que os erros musicais cometidos no Aqua praticamente o fizeram ser deserdado.

OS PROBLEMAS

O primeiro deles é que o Aqua soa completamente diferente do que se espera de um disco do Angra. O disco possui aquele som extremamente fechado e redondo, bem diferente do som expansivo do Temple of Shadows. Isso, se por um lado foi importante e encaixou perfeitamente na proposta do álbum, por outro causa um estranhamento grande à primeira vista. Basta comparar as dobras de guitarra na introdução de Arising Thunder, do Aqua, e de The Temple of Hate, do Temple of Shadows, para entender do que eu estou falando.

O segundo ponto é que, se tem duas coisas que o Temple of Shadows tem de melhor que o Aqua, essas duas coisas são voz e bateria. Enquanto o Temple of Shadows tem linhas de bateria e de voz excepcionais, o seu primo deserdado tem grandes problemas nesse sentido, pois a voz de Edu Falaschi já não soava tão bem quanto antes e as linhas de bateria de Ricardo Confessori são – para não pegar pesado – fracas.

Além disso, é importante ressaltar que a banda não parecia se encontrar no ápice da sua capacidade de composição. Hoje em dia vejo que algumas músicas simplesmente não soam tão bem quanto poderiam soar, como por exemplo Awake From Darkness. Afinal de contas, Awake From Darkness é uma música tão complexa e detalhada quanto, por exemplo, Winds of Destination – então por que a segunda é sempre tocada nos shows e a primeira vive esquecida? Quando você ouve e compara, fica bem claro que uma tem a qualidade e o apelo musical que a outra não tem.

Mas o ponto em que eu quero chegar é: essas mudanças de fato caracterizam o álbum como ruim? No meu ponto de vista, não. O Aqua é um disco que eu diria ser parecido com o No Prayer For the Dying, do Iron Maiden – são dois discos cujas qualidades foram ofuscadas pelos problemas da época, mas que se tivessem surgido em momentos diferentes teriam sido melhor trabalhados e consequentemente alcançariam um êxito maior. E sempre – SEMPRE – que eu ouço Ashes, eu tenho certeza de que a banda não morreu naquela época. E ainda me pergunto como deixam uma música dessas de lado.

Então eu te proponho, fã de Angra que não gosta do Aqua: dê uma chance ao álbum. Tire a poeira dele e tente ouvi-lo sem os tímpanos amargurados. Não vou garantir que você não vai se arrepender, mas te proponho uma nova experiência, dessa vez sem os vícios de antes. Pode não ser o melhor disco do Angra, mas com certeza não é um álbum que merece ser esquecido – categoria na qual eu coloco o Aurora Consurgens, que, apesar de ser bom, não tem rigorosamente nada a ver com o Angra da fase Edu.

Mas os anos se passaram e atualmente a banda está com Fabio Lione, fazendo shows mundo afora e com disco novo para sair. O que esperar do novo disco, Secret Garden? Será que vem algo bom por aí? É claro que vamos fazer um jogo de adivinhação aqui no Oráculo e tentar prever o que virá por aí. Mas para isso você terá que esperar até semana que vem.