Slash – World On Fire

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Eu me lembro muito bem de como conheci a banda solo do Slash. Estava em casa, zapeando pelos canais, quando vi que um canal a cabo transmitia ao vivo o show dele no Rio de Janeiro. Resolvi parar para assistir, e demorou apenas quinze minutos para eu xingar muito no Twitter por não ter ido ao show.

Eu não conhecia rigorosamente nada do Slash pós-Gn’R, mas fazia tempo que eu não via uma banda com tanta energia em um palco. Era incrível ver como o próprio guitarrista parecia rejuvenescido, estando com uma banda de apoio extremamente competente e com um vocalista que parece ter nascido para cantar Hard Rock. Indo mais além, diria que Myles Kennedy parece ter nascido para cantar Hard Rock com o Slash.

MYLES É MELHOR QUE AXL PORQUE USA CALÇAS

O entrosamento deles era gigantesco, Slash e Myles pareciam se completar. Até hoje, eu fico abismado com a conexão forte que existe entre eles, que lembra a que existia entre Axl e Slash na época do Guns. O fato é que, ainda que Axl esteja batendo cabeça para achar alguém que substitua o guitarrista da cartola, este parece já ter achado alguém para pôr no lugar da maritaca ruiva que usava saias.

Depois do fatídico show que eu assisti na televisão, não demorou muito para eu procurar mais sobre a carreira solo do Slash, e me surpreendi com a qualidade das músicas. De fato, Slash parecia mesmo rejuvenescido, bem diferente daquela paródia de si mesmo que Axl se tornou.

Assim, fiquei curioso para saber como ele soaria neste novo disco. A verdade é que ele mantém o nível do primeiro, porém intercalando entre acertos e erros. Apesar de em alguns momentos eu bater palma pela novidade acrescentada por Myles Kennedy, em outros essa novidade acaba gerando músicas irregulares. Quer entender? Vamos ao faixa-a-faixa.

AXL É MELHOR QUE MYLES PORQUE É RUIVA – COM “A” MESMO

O disco já começa espetacular com as primeiras músicas. World On Fire tem um refrão extremamente pegajoso, porém não soa como Hard Rock dos anos 80 reciclado. Ao contrário, o clima das músicas sugere um frescor e um vigor que não viria de um guitarrista com tantos anos de estrada, mas sim de um músico novo – sim, estou falando do nosso amiguinho Myles, e esta é a tal novidade que eu já tinha falado anteriormente.

É por isso que eu digo que a junção dos dois deu tão certo. É o viço de um e a experiência do outro. E isso não se restringe à primeira música. As seguintes, Shadow Life, Automatic Overdrive e Wicked Stone, também possuem essa vitalidade. Com ótimos refrões e ótimas linhas de guitarras, temos músicas que funcionarão muito bem ao vivo.

30 Years to Life também se mantém como bom representante desse ardor do qual eu tanto falo e tanto vou falar ao longo da resenha, porém é uma pena que seja seguida de uma balada tão fraca e sem sal quanto Bent to Fly. Esta balada, com seu refrão excessivamente exagerado, é um grande exemplo de que às vezes menos é mais.

Stone Blind, a música seguinte, é uma boa música, despreocupada e agitada, mas sem muito a acrescentar. A seguinte, Too Far Gone, conta com um riff de guitarra bem diferente do que Slash costuma fazer, o que me faz pensar que não foi o nosso amigo de cartola que fez, mas sim o vocalista, uma vez que ele não só canta mas também toca guitarra. A música, por sinal, tem um clima bem diferente do mostrado no início do disco, sem soar tanto como Hard Rock quanto eu esperava, o que é levemente decepcionante.

MYLES É MELHOR QUE AXL PORQUE AINDA CONSEGUE CANTAR

Beneath the Savage Sun repete a estranheza da música anterior. Ela abre a segunda metade do disco com um coro deveras estranho, e nessa música temos um Slash que não é Slash, o que pode ser bom ou ruim, dependendo do seu ponto de vista. Permeada de bastante experimentalismo, ela não se encaixa nem um pouco na proposta Hard Rock que o disco possuía no início. A descaracterização é tanta que, lá no final do solo, vemos o guitarrista tocando como se ele fosse um virtuose à Yngwie Malmsteen – coisa que nunca foi.

A próxima faixa, Withered Delilah, volta ao clima das primeiras faixas, com um riff bastante puxado para o blues. Battleground faz um pouco melhor do que a primeira balada do disco, porém ainda se mantém esquecível e passa batida quando você se lembra de que Slash, há não tanto tempo assim, fez uma balada como Not For Me.

Dirty Girl é bastante parecida com Withered Delilah, também com forte influência do blues. Iris of the Storm, ao contrário, é uma “balada com clima de rock”, sendo a que funciona melhor em comparação às outras duas supracitadas. Avalon parece bastante com as primeiras músicas do disco, o que me faz pensar que ela deve ter tropeçado no meio do caminho e caído no fim da lista por acidente.

AXL É MELHOR QUE MYLES PORQUE TEM UM SOBRETUDO AMARELO

The Dissident possui o riff mais legal e revigorante da segunda metade do CD, sendo uma grata surpresa por possuir também um refrão pegajoso e mais Hard Rock do que nunca. Esta é a música em que as influências de Slash e Myles mais se equilibram, e tem a grande chance de se tornar um hino da banda. É uma pena que esteja tão escondida.

Safari Inn segue o mesmo viés blueseiro de Dirty Girl e Withered Delilah, mas é apenas um momento solo de Slash – o que, vale dizer, não é nem um pouco ruim. The Unholy, a última música, é bastante próxima de Beneath the Savage Sun, mas sendo ainda mais experimental. Curiosamente, ela até que funciona muito bem, mas a impressão final é a de que essas duas músicas, junto com Too Far Gone, não deveriam estar aqui.

QUEM GANHA: AXL OU MYLES?

O saldo final é positivo, mas é necessário tocar em alguns pontos. O disco possui 17 músicas e pelo menos três delas poderiam simplesmente não estar ali, o que traz uma irregularidade que poderia ser contornada facilmente reduzindo a quantidade de músicas. Além disso, a própria organização das faixas não ficou tão boa, com músicas bastante diferentes se intercalando e não criando uma linha de raciocínio musical, o que é necessário em qualquer CD, o que acabou custando um Alfredo e meio ao disco.

Se você gostou do primeiro disco, pode ter certeza de que vai gostar de grande parte deste também. Agora, se você não tem a mente aberta, muito cuidado – pois você pode ter algumas surpresas.

CURIOSIDADES

– Você sabia que Slash está tendo aulas de guitarra com Myles Kennedy?

– Eu nunca usei tantos sinônimos de uma palavra na minha vida, e desafio você a acharem todos os sinônimos de “moderno” utilizados neste texto. O prêmio dessa vez será grande: dois high-fives telepáticos e meio quilo de presunto imaginário.

– Você se lembra de quando Axl fez um show no Rock in Rio usando aquela roupa amarela que lembra muito a capa dos transeuntes do episódio Pica-Pau Desce As Cataratas? Fique com essa imagem na cabeça e bons sonhos.